Na sexta passada eu tive uma conversa surpresa com meu
irmão...Ele me contou sobre as múltiplas motivações e desmotivações que teve em
sua árdua escolha para a filosofia, um campo em que ele anda com grande
maestria, me contara sobre isso devido a um desabafo meu sobre o meu futuro...Porque? Porque eu queria ser
cientista.
Dias antes eu havia lido um texto com dez motivos para não
se tornar um cientista, grande parte deles abordava decepções financeiras e
acerca de não reconhecimento...Geralmente eu não sou abalado por esse tipo de
texto, mas meu ser estava tão quebrado, abalado, que o mais leve dos ventos se
tornaria um furacão negro, com a força compressivamente destruidora de mil
buracos negros supermassivos. Ele ( meu irmão) me aconselhava e dizia que isso
era normal por eu não saber o que eu queria para minha vida, algumas lágrimas
derramadas e com meus medos expostos, me despedi de meu irmão (Como agradeço
sua colossal presença e compreensão meu irmão!) e me pus a estudar o mais cruel
dos enigmas, a mais difícil das equações: Minha própria mente!
Envolto de arlequins diabólicos, serpentinas que me
enforcavam em sua cegueira, dançarinas que me seduziam a loucura e meus
pesadelos....Este fora meu carnaval onde a verdadeira festa era o meu
sofrimento áureo.
No primeiro dia eu me desesperei. Não pensava em nada e
tentava voltar ao passado para ver como eu me portava, como eu havia parado
nessa situação. Eis que me lembrei.
Eu era um garoto tímido que escondia em falsas expressões de
humor querendo esconder meu verdadeiro ser, além disso, eu possuía uma baixa
auto-estima devido a minha aparência e isso me deixava cada vez mais
abalado...Para piorar a situação toda tinha um fantasma em meu passado que
voltava rondando por vez ou outra, ele se aliava a minha criação: fui criado
com todos os luxos que uma criança de classe pobre sonha em ter se fosse de
classe alta, brinquedos, roupas, tudo que se possa imaginar eu tinha, exceto um
bem sentimental precioso que eu prefiro contar em outra postagem.
Meu desempenho escolar nunca foi ruim e eu não posso mentir.
Nunca cheguei a ficar em recuperação em nenhuma disciplina e tão pouco a
reprovar, não era o aluno modelo, mas não era nenhum desinteressado, as séries
foram passando mais e mais e já no ensino médio eu me encontrava a beira de um
vestibular, mas não tinha consciência de nada disso, eu corria em círculos e
parecia nunca perceber isso. Frente a isso eu me lembro da primeira vez que
ouvi a opinião de alguém de fora em relação à faculdade:
“Ah você gosta tanto de jogar... Deveria fazer
computação...Nerds sempre fazem computação”
Eu nem sequer me achava nerd, mas ser o carinha estranho com
óculos e aparelho que não vivia com uma namoradinha e bebia nos fins de semana
em casas de forró, me rendia isso. Poxa mas computação parecia legal, por que
não?
Passei então a inflar o peito com o mais rarefeito dos ares
e dizer: quero fazer computação! Dá dinheiro e eu ainda posso ficar jogando.
O ensino médio era voraz, com disciplinas mais pesadas e com
um cursinho à tarde (eu estudava em tese 12 horas por dia) eu só queria passar
em computação, mas não sabia por que eu queria querer isso.
No final do segundo ano eu recebo uma bomba: minha rinite
alergia evoluira como já esperado e se transformara numa conjuntivite alérgica,
logo de inicio eu simplesmente não enxergava nada e todos os tipos de remédios
me foram testados ( tenho seqüelas até hoje, e riscos maiores de câncer no
futuro devido a eles), mas nada adiantou, para piorar meu olho inchava ( ainda
incha, mas em grau muito menor) impossibilitando a visão e enfeiurando-me ainda
mais. A melhor de todas as noticias é que me pálpebra estava começando a abrir
e como conseqüência eu enfrentava duros sangramentos (hoje em níveis menores),
de forma a chorar sangue. Um estudante pré-universitário com o órgão mais
necessário prejudicado: a visão.
Aliado a essa saga de doenças eu ainda enfrentava o bullying
de alguns “colegas” o que me depreciava ainda mais e só me desmotivava, ainda
assim eu enfrentava a dura responsabilidade de entrar numa faculdade (e que curso eu queria mesmo?) pois bem eu
acabei entrando passei em Licenciatura em química no IFCE, mas por greves e
pelo meu desinteresse em licenciatura ( na verdade isso vai se tornar um
paradoxo mais adiante ), me fizeram estudar mais uma vez com mais calma e persistência,
ao procurar outro curso eu encontrei matemática industrial, a grade parecia
muito com computação e parecia ser algo inovador, por que não tentar? E me
motivei de novo em ares com poucas partículas de oxigênio, iria tentar
Matemática industrial. Consegui, entrei.
No segundo dia eu comecei a pensar no quanto eu mudei do
inicio do curso até agora.
Desde o início do curso eu pude notar o quanto a liberdade
da UFC era prazerosa, vindo de um colégio militar eu sempre tive uma veia
revoltada em mim, seja aliada ao rock ou a minha não conformidade em aceitar
ordens sem explicação ( chegou-se a tanto que no último ano do colégio eu usava
anéis em todos os dedos de ambas as mãos ), na UFC não...Eu poderia ser quem eu
quisesse ser, tinha a liberdade de camisa, cabelo grande, e por um tempo me
deleitei disso ( que não se lembra da minha trança roxa-vermelha?), mas isso
foi uma fase tão simplória que eu mesmo não notei seu cessar. Meu peso diminuía,
minha postura mudava e eu simplesmente ia mudando com tudo isso, e as perguntas
de matemática industrial ser o que eu queria iam me perturbando cada vez mais:
eu sabia que gostava do curso, mas não queria trabalhar numa empresa... Tudo me
aparentava tão monótono e repetitivo. Pensei em ser um pesquisador, mas minha família
sempre me falava ( e fala):
“E não vai trabalhar não? Vai viver só de estudos? E o dinheiro?”
Dinheiro! Dinheiro! Dinheiro! Dinheiro!...Se quisesse certeza
financeira eu faria um concurso público ou seria um ofical militar como tantos
desses meus colegas são, mas isso me faria feliz? Eu tinha que fazer uma coisa
com me proporcionasse rios de dinheiro mesmo que não fosse feliz? Não parecia
estar vivendo minha triste infância de novo? Cheio de bens materiais e sem
nenhuma alegria, que é o que realmente mantém o ser vivo ( já que bens
materiais um dia vão embora)?
De segunda para domingo eu não me lembro quantas vezes
acordei, mas devo ter fechado os olhos por pouco mais de 2 horas. No resto
segui o brilho da escuridão da madrugada.
Na segunda eu já agonizava de sofrimento...Era o terceiro
dia e eu ainda tinha muita coisa para analisar, haviam cartas na mesa mas
nenhuma jogada em mente. O sono pareceu ter sido roubado de mim, como se Morfeu
me tivesse castigado com a insônia como Prometeu fora com o fogo.
Parei e analisei as palavras que me foram ditas pelo meu grandíssimo
irmão e pela minha linda Laresca, ainda assim parecia tudo turbulento e eu
cheguei a ponto de não me enxergar, me sentir opaco, inútil. Eu havia saído do
colégio como 5º melhor aluno de toda a turma, e isso não tinha nada a ser
comemorado, eu havia sido promovido a major ( tão forte quanto papel de arroz
frente a água) e isso parecia ser apenas um pedido de desculpas de ter sido
acusado por certas coisas nas séries anteriores do colégio. Nada faria sentido,
por que não findar logo isso? A visão cuestral de minha janela parecia tão
mortalmente linda. Era fácil terminar isso ali mesmo, ninguém saberia e nem
falta a ninguém eu faria.
Não consegui, agradeci ao medo instintivo que me protegeu de
alguma catástrofe.
Eis que na madrugada do terceiro dia eu começava a ver as
coisas com maior lucidez:
Por que eu deveria me prender ao passado de não ser um bom
aluno? Afinal eu não era um aluno no mínimo tão capaz quanto os outros? Será
que aquele lacrimejamento hemofílico de estudos não tinha significado nada? E
os elogios que tantos me deram? Alguns viam de pessoas que eu realmente
considerava, que eu realmente considero e que agradeço todos os dias ter
conhecido, essas me conhecem tão profundamente... Seus elogios não poderiam ser
baseados em areia e sal. Lembrei-me das vezes que uma ou duas palavras dos
professores me levantavam, de quanto às pessoas se sentiam a vontade para me
pedir ajuda. Eu significava alguma coisa... Por mais nulo que tentasse ser,
ainda era um valor.
Meus pais me desmotivaram mais uma vez dizendo que eu ia me
arrepender:
“Você é novo, quando chegar aos 30 vai perceber que precisa
de uma coisa chamava aposentadoria!”
Mas se eu, com vinte anos pensasse em quanto possuir trinta, eu
viveria dez anos em congelamento, e logo depois eu já deveria planejar em como
vou querer me aposentar? A vida é curta a tal ponto de zerarmos todos os meios
e pensarmos apenas em como ela tem que ser no futuro? Esperando que dinheiro
compre alegria, vontade, paz? Isso não tem nenhum sentido.
No quarto dia eu comecei a juntar as coisas e perceber o
quanto eu sou especial para mim mesmo... Eu não sou o mais culto dos sábios,
sei pouco de pouco e talvez por saber que pouco sei, saiba um pouco mais
daquele que supõe saber de algo a mais do que realmente sabe.
Eu me lembrava da excitação em ver as cadeiras do curso que
eu já estou, foi um fato completamente marcado por aleatoriedades, mas que no
final era o que eu tenho vocação em ser ( e para se ter vocação não é preciso
tirar dez em todas as notas, é preciso apenas querer tirar dez). Lembrei que
algumas pessoas me pedem ajuda e que se eu fui escolhido com um projeto de ajudar
pessoas ( ainda considero ensinar uma palavra muito forte) com cálculo I, é por
que possuo capacidade pra isso. E sinto uma felicidade enorme em ver que as
duvidas são sanadas e que posso progredir com o conteúdo. Se até quem eu
considero com o mais culto dos sábios, já disse que aprendeu muita coisa comigo,
devo significar alguma coisa.
Eis que chega o quinto e último dia:
Pareço ter renascido ( ou finalmente ter sido parido) para a
realidade, quero seguir a carreira acadêmica, pois o momento que eu mais me
vejo bem é quanto estou estudando, seja Matemática, Programação, Química,
Astronomia ou a mais nova aquisição de meu gostar pessoal: a Filosofia.
Parece que não vou ser um garanhão hexazilhonário ultra mega
power blaster rico, mas eu não preciso disso... Eu só quero ter onde dormir, o
que comer, uns trocados pra comprar uma bolsa furreca, outros trocados pra
comprar xerox de alguns livros, não vou ser hipócrita em dizer que não quero
algo um pouco mais caro, mas sei viver muito bem com o pouco que tenho (e que
na verdade é muito mais que se imagina), do resto são perolas de pessoas
maravilhosas que adentraram em minha vida e que eu não pretendo me desprender
nunca mais.
Nesse quinto dia eu pus as ultimas idéias no lugar, e ao
encontrar meus pais , respondi isso quando desejaram a conclusão da minha formação para que
logo eu fosse trabalhar:
“Olha, eu vou falar de modo que vocês entendam: Eu quero ser
um pesquisador, um cientista,por mais bobo que isso possa parecer na cabeça de
vocês, poxa! Vocês são meus pais e eu só quero ser eu mesmo, isso é algum
delito? Não quero que achem bonito, que aplaudam, que se orgulhem... Quero que
respeitem. Eu só quero que vocês me apóiem, e mesmo que não me apóiem, me
desculpem mas eu não vou desistir do meu sonho, ainda que eu reprove, que eu
tire zeros, que eu chore, que eu grite e esbraveje de ódio, eu não vou desistir
deste verdadeiro ducto que liga meu ser material a minha alma”
Eles continuaram falando, mas do contrário de todas as
outras vezes, eu não me irritei, eu não me chateei, eu estava ocupado demais
para isso, eu tava estudando...
O que eu quero dizer depois desse desabafo, é que você
andarilho, não desista do seu sonho e mesmo que pareça não possuir nenhum, siga
seu coração. Eu acredito em você ser feliz com seu sonho, demore o tanto que
for pra encontrar, não tem problema e isso não te torna anormal. MAS QUANDO
ENCONTRAR, NÃO O SOLTE NUNCA MAIS! LEU BEM? NUNCA MAIS!
Eu não sei o que você quer ser... Mas eu quero ser um
cientista.